Ouvi diversas opiniões demonstrando insatisfações iradas quanto ao processo eleitoral democrático em nosso país.
Excetuando as raivas e rancores personalíssimos contra candidatos e quanto à própria vida do opinante, o que, infelizmente, mudava um pouco o foco da discussão, mas não deixava de ser avaliado, muitas das conversas pessoais começavam pelo estarrecimento do interlocutor em descobrir que não seguia a linha de pensamento que ele imaginava que eu seguisse. Viva o estereótipo.
Foram de fontes muito variadas, chegando até a questionarem a democracia por excelência. As opiniões vieram, majoritariamente, de eleitores que viram Serra e Alckmin perderem as eleições para Lula, respectivamente, nas eleições de 2002 e 2006.Daqueles que têm uma série de medos. E muito embora o próprio Fernando Henrique Cardoso, recém ex-presidente de então, dissesse que a eleição de Lula fosse uma vitória da democracia, pipocavam o desejo declarado do retorno à ditadura militar.
Desnecessário explicar o que é democracia para os que aqui vêm. Desde de sua etimologia até as versões de democracia apresentadas à humanidade ao longo de nossa história, mediante os discursos ideológicos que camuflam autoritarismos e oligarquias, parece que cada um tem seu próprio conceito de democracia.
A emoção, o sentimento e o inconsciente, não têm muito lugar no discurso político, ou, melhor dizendo, quando se trata de política conforme é reportada pela imprensa, como uma seção e não como ciência ou arte. Falar de política ainda traz a ética, a moral, a missão pétrea e tenaz, o “tudo ou nada”, “ bem e mal”, como norteadores do discurso.
Uma análise de conjuntura, uma olhada no processo histórico, social e político do Brasil (e também da Iberoamerica) e uma reflexão sobre o sentimento de classe – ainda que a luta de classes seja desconsiderada em muitos discursos políticos atuais – não são ponto tomados como devida parte de uma dialética, para uma discussão. E embora fosse dialética, ainda faltariam ponderações sobre uma terceira ou quarta visão.
O interregno de 1985-89 foi capaz de nos dar uma constituição e uma eleição direta. Forma e matéria para uma democracia, ou seja, Constituição cidadã e eleições diretas baseadas na isonomia (todos podem votar, sendo o voto secreto, e são obrigados a comparecer às urnas [ponto para discussão]) e na isegoria, cada voto vale um. Neste espaço vejo que não caberá, porém, as discussões e as considerações sobre a cidadania da Constituição de 1988 e a transparência das Eleições de 89.
Eleito Collor, dois anos foram suficientes para que houvesse o impeachment, que pelo termo em inglês tem a aprovação da democracia estadunidense (o que ainda é bom lá parece ser para nós cá); assume o vice, Itamar Franco. Foi muito importante um vice assumir e terminar seu mandato.
Novas eleições e, pelo voto direto, democrático, FHC, na nova linha Social-Democrata (uns chamam de neoliberalismo) assume a presidência. Luta pela reeleição, emenda-se a Constituição, é reeleito. Emenda Constitucional no. 16 do Capítulo IV, art. 14, §5º.:
Art. 14 - A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:(...)
§ 5º - O Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subseqüente.(redação da E.C. nº 16, de 04.06.97).
(texto anterior)§ 5º - São inelegíveis para os mesmos cargos, no período subseqüente, o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido, ou substituído nos seis meses anteriores ao pleito."
Nenhum golpe visível.
Continuando o processo democrático, Lula é eleito e reeleito nos pleitos sequentes. E no fim do mês de outubro deste ano, de novo, poderemos escolher o presidente, ou Dilma Roussef, ou José Serra; apesar do STF, apesar da imprensa que toma parte no processo eleitoral, apesar das alianças, apesar da... política.
Portanto, onde é que cabe a revolta sobre a democracia eleitoral brasileira? Será que a democracia só é válida se for o seu candidato o eleito?
Não gostar do que representam Lula, FHC, Dilma, Serra e qualquer candidato a nos representar é normalíssimo e há de ser divulgado sempre... numa democracia.
Petrópolis, 4 de outubro de 2010.
Tem gente de todas as gentes, caras e expressões. Assuntos pertinentes, pretendentes aos nossos bilhões; momentos de reflexões das salas de aula a uma mesa de bar, feitas ontem ou anteontem, há mais de década; desde as realidades insignificantes, às fantasias dos nossos semblantes.
Se tem algo que não tenho, Peste, é educação política. Gostaria de ter interesse, mas não tenho. Quando chega o dia de eleição, eu me arrependo de não ter pesquisado sobre os candidatos. Mas, em contrapartida, quão verdadeira é a informação pesquisada? Quando o assunto da mesa de bar são as promessas dos políticos, eu penso quais se adequam aos interesses do país, no meu ponto de vista. Mas, é muito fácil prometer. Por isso tudo, hoje em dia eu faço diferente. Eu vou pela minha intuição: se eu vou com a cara eu voto, se eu não for eu não voto. E pronto!
ResponderExcluirPeste, é outro ponto que adoraria discutir e escrever: "As promessas políticas, o compromisso e a garantia de suas eficácias". Seria legal haver algumas punições para descumprimentos injustificados.
ResponderExcluirGrande Thiago, sou grato.
ResponderExcluirTodos os poderes mentem ao povo senzalado mundialmente.
A ditatorial casa grande no controle das mentes através da propaganda manipuladora da opinião pública (midiotizada e estupidificada até a medula) enfatiza a submissão ao seu supermercado antropofágico do consumismo.
As vezes um Tiririca ou outro escapa ao controle; são as exceções que confirmam a regra.
Queixo-me da democracia, principalmente, pelo esvaziamento do debate político. Queixo da democracia pelo avanço do marketing e da censura. Queixo-me da democracia pela espera e adiamento da necessária reforma política. Queixo-me da democracia por razões que inviabilizam a própria democracia. Queixo-me, portanto, da democracia, por ela não ser efetiva. Por se tratar de utopia a democracia.
ResponderExcluir...no entanto, creio em utopias.
Excelente reflexão. Tem gente no twitter que bloqueia aqueles que declaram voto contrário. Agora parece que ter opinião política diversa virou crime... Ora, então todos têm que pensar da mesma forma?
ResponderExcluirA beleza está na diversidade e no debate aberto, franco. Fazer boa política é uma arte difícil, mas parece que os atores atuais estão se esquecendo do básico!
Beijos
Ana Leticia
www.mineirasuai.wordpress.com
Este vídeo, muito comentado na época, exemplifica o quanto o conceito de democracia é deturpado, por ignorância, ou por burrice estratégica [que, na minha opinião, é o papel desempanhado pelo senador Agripino Maia neste vídeo].
ResponderExcluirhttp://www.youtube.com/watch?v=ydzxMpYAKZE
Muito bom seu texto. Também fico assutada com quem acha que o eleitor do outro não sabe votar, é manipulado, ou que é tudo um golpe quando seu candidato não ganha. Democracia tem que ser também saber perder.
ResponderExcluirOlá, Thiago! Gabi Zanini me recomendou seu blog. Sou a doida que ousou escrever no FB que estou com nojo das pessoas que ficam te julgando só pq vc votou em fulano ou em cicrano. Fiquei feliz que meu desabafo tenha gerado outros, como o seu. Muito bom texto! Parabéns!
ResponderExcluirQd vc puder, veja o blablablá que se seguiu ao meu comentário no FB... Acho que comprei uma briga feia com um velho amigo, rsrs... Mas depois das eleições isso passa. Espero...
Beijos!
Ana Prôa
www.analuciaproa.blogspot.com
Thiago,
ResponderExcluirestamos fritos. De uma forma, ou de outra!
Meu nobre Quintella, até pelo fato do Brasil ser uma jovem democracia dentro de uma história marcada por ditaduras e abusos de poder, talvez possamos dizer que há avanços, inegavelmente.
ResponderExcluirDepois dos estragos feitos pela vitoriosa revolução "redentora", vai demorar um bom tempo para que a população descubra o que é política, cidadania e democracia. Interessante que muita gente séria acreditava mesmo no poder da internet nestas eleições brasileiras, que aconteceria, nas palavras de alguns especialistas, mais ou menos o mesmo fenômeno "Obama You Can" nos EUA.
O acesso à informação é um fato, mas o que fazer com isso é o "x" da questão. Um lado demonstra fazer uso nada salutar à democracia, soltando notas, correntes de e-mails, blogs e vídeos montados sobre uma candidata procurando estigmatizá-la; já o outro lado se mostra meio perdido em relação a isso porque já é estigmatizado: faça o que fizer, será "contra a democracia e a liberdade de imprensa".
Assim fica fácil, é a visão "unilateral" do que é democracia de acordo com uma parte considerável da grande imprensa e seus difusores. E daí pro preconceito é um pulo, coisas do tipo "nordestino é quem esculhamba com as eleições neste país votando no assistencialismo".
Bastante DEMOcrático...
Abs, meu velho!